sábado, 10 de dezembro de 2011

Solo infértil.

A fonte secou
Ideias ainda borbulham
Mas nada brota
Nenhum texto, nenhum verso, nenhuma palavra
A arte escrita recusa sair da mente
É uma cidade fechada
Um presídio

Buscar a morte a cada dia
Buscar renascer a cada momento
Talvez a escrita morreu
Uma outra não nasceu
O vazio floresceu
Herança do caminho percorrido

Por força na tecla
Forçar a caneta já seca
Como espremer bagaço de laranja
Até quebrar o lápis
Surrar um solo infértil

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Máquina do tempo.


- O que você fez enquanto eu dormia?
- Fiquei pensando em como será a minha vida.
- O que você pensou?
- Fiquei pensando se minha vida vai ser boa ou ruim, e dormi.
- Sua vida vai ser boa.
- Queria que minha vida fosse como um filme de ação, cheia de explosões, ia ser muito legal.

Pensei em dizer que na vida real as pessoas morrem e é triste, mas não seria bom tocar no assunto “morte”.

- Isso é só nos filmes, a vida real não é assim.
- Felipe, queria ser inventor quando eu crescer, daqueles que inventam coisas. Eu ia inventar uma máquina, seria uma máquina do tempo, com ela a gente poderia voltar no tempo. Por exemplo, uma pessoa morreu, a gente pegava a máquina e ia voltando no tempo, até essa pessoa estar viva novamente, então a gente poderia ver essa pessoa novamente. Aí eu ia poder ver minha mãe de novo, ia ser muito legal.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Comentário sobre Anne

Anne e seu vestido azul
Tão belo, chama-se blue
Anne das unhas multicoloridas
Unha multicolor
Enfeita Anne tatuada pelo calor
O Sol prestigia suas várias vidas

Anne e sua pose de viagem
Olhar achado, longe de qualquer bobagem
Talvez seja maconha
Delicia-se na miragem
Oculta paisagem
Ela apenas sonha

Anne e seu brinco de pena
Valoriza sua pele morena
Beleza do norte
Não é beleza exótica
É simplicidade que toca
O pássaro perdoa a própria morte

Anne e seu olhar egípcio
Por ela um mortal avança no precipício
Tanta beleza deve ser castigo
Seu rosto pode ser maia
Figurante, pousada na praia
Engrandece um filme antigo

Sua posição é oeste
Sua posição é noroeste
Depende de quem vê
Com seu vestido azul
Todo mundo é sul
Maquiagem de TV

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Continuar

 A tempestade vem longe, negra, horripilamente; mas ainda não é hora de abandonar o barco. O mar treme, as ondas aumentam, raios cortam o céu; mas ainda não é hora de desespero. Espere a tempestade chegar. O motor começa a falhar, as luzes começam a piscar; mas ainda não é hora de chorar. A tripulação enlouquece, o casco racha; mas ainda não é hora de pular. Os passageiros se matam, o barco afunda; mas não pode se afogar. Procure um pedaço de madeira, espere, beba água dá chuva; será difícil, mas ainda não é hora de morrer. Nade até a ilha mais próxima. Descanse, ore, agradeça o ar, o sol e a chuva; nunca é hora de praguejar. Faça um sinal com pedras, um sinal de fumaça, um sinal telepático; ainda não é hora de se ocultar. Construa uma jangada, um barco, um dirigível; ou construa uma casa, uma varanda, habite a ilha. Talvez alguém tenha sobrevivido com você; erga seu país, sua civilização.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Cantando para Iris

     O vento sacudindo as árvores, as folhas iluminadas pelo sol, os raios dando vida a tudo, o rio correndo, dando vida também; um pássaro passa na água, pousa na sombra; a sombra acolhe a família.
     A pequena menina canta para a irmã, que repousa no colo do pai; a mãe toca violão. A canção deu nome à bebê de um ano de idade; vestiu-lhe bem, um belíssimo nome. A mais velha, de dez anos, adora a canção. Cantou para a irmã, quando esta estava na barriga - a menina quem fazia a mãe dormir com canto -  e prometeu cantar por toda a vida, mesmo quando estivessem velhinhas - promessa de uma linda história de amor e amizade.
   A música soa no ar, por cinco vezes; algumas outras belas melodias decoram uma linda tarde. A menina não é muito afinada, mas a cena toda é linda.
   Uma voz sai da janela branca. Era a  avó, ou uma tia, talvez uma amiga. O bolo está pronto. Será saboreado com suco de laranja. Depois terá mais música, brincadeiras, alegria. Os primos ainda estão para chegar. Um glorioso final de semana.


A música: Iris

Iris, olhando as penas coloridas dos concrises
Dos sabiás, dos rouxinóis e das perdizes
Lembrei de ti, oh, linda iris
Será que somos dois eterno aprendizes
O amor se planta e ganha a força das raízes
Oh, Iris
Quando vieres caçaremos arco-iris
E borboletas para tu de distraires
E só importa que eu delire e tu delires
Oh, Iris
(Alceu Valença)



http://www.youtube.com/watch?v=o-YQfxKGihs

quarta-feira, 4 de maio de 2011

moça da rosa / Carta

Um rosto extranatural
Efeito das rosas na janela
Catarsia-se no aroma elemental
A broche engrandece a aura amarela

Aparata o cabelo com flores do campo
Adorna-o pra agradar as rosas
A voz da rosa elogia o vestido de trapo
Tamborila no livro de poesia e canta cantigas

Beleza de semideusa
Num espelho admira-se ao amanhecer
Olhos de pérolas com ar de princesa
Matizados pelo sol pra um arco-íris florescer

De tarde passeia seu charme inato
A favorita dos moços do pequeno vilarejo
Ilusões escandecentes no pensamento
Faz ventar num demoroso caminhar que precede um lampejo

De noite saboreia um delicioso caramelo
As estrelas juram para sempre lhe amar
Pontual, repousa num sono singelo
Na teia dos sonhos banha-se no mar

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Uma carta contém vários significados
Sonhos esquecidos e sonhos vivos
Uma carta revela mistérios
Mensagens, boas novas
Segredos ocultos
Desejos revelados
Um pedaço de papel mal escrito
Um punhado de tinta bem desenhada
Na ponta da pena, na caneta
Amores perdidos, encantos achados
Esperança e descrédito
Carta romântica, carta amiga
Carta de encontro e de despedida
Resistindo à modernidade
A corte ainda transporta vidas inteiras
No papel, no toque
Guardado no armário
No caderno, na gaveta
No coração e na alma

segunda-feira, 2 de maio de 2011

O tempo que passa

Vejo o vento que leva
Ouço o tempo que traz
Fito a noite que morre
Flerto o dia que cai

A roda louca enrosca meu andar
Um navegar marasmático
Na cadência de uma leve brisa
Os senhores do ar não têm pressa

Cada dia é uma versão acústica
Um acorde suave e pesado
Lento como um chumbo dourado

Cada raio solar é uma lanterna
Iluminando caminhos neste eterno apagão
Toda fogueira é vagalume
Repousa admirando as estrelas

Todo momento é mistério
O espaço é minha estrela guia
Semeia ilusões
Povoa meus sonhos

Vejo o tempo que passa
Ouço o vento que morre
Dia e noite se anulam
Num suicídio mútuo

Choro de Gaia

Escuto Gaia que chora
Agoniza, definha rapidamente
Já sem o brilho doutrota
Falecerá repentinamente
Veias cheias de lixo
A pele devastada
O corpo murcho
A energia atordoada
Câncer por todo canto
Seus filhos, podres células
Não há cura, magia ou encanto
Não há fórmula para curá-las
Um ciclo chega ao fim
É preciso morrer para nascer
Arcanjo, Virtude, Seres de Luz, Serafim
Arquitetos do novo amanhecer
Colhendo, separando o joio do trigo
Aqueles que contra a maré navegam
Anelam o esplendor de um tempo antigo
Trabalham as chaves que lhes entregam
Caos, tragédia, selvageria, desespero
O homem cada vez mais animalesco
Instinto cada vez mais mortífero
Um cenário dantesco
Tempo de fogo e treva
Como anunciou cada profeta
Tristeza o futuro nos reserva
Logo a história estará completa

Carta para Lelê

  Querida Lelê,
hoje é sexta-feira, a última de abril de 2011. Este ano parecia tão distante e agora estou nele. O tempo fica mais veloz; talvez sua idade não lhe permita compreender. Por muito esperei este ano e nada ocorreu como desejei.
  Espero que esta seja a primeira de muitas cartas; poderá se acostumar com meus garranchos, erros e citações.
  "Faz um tempo, eu aguardava tudo para um dia especial, distante. Fui ficando mais calado e mudo até sacar que o futuro é uma meta flutuante".
   A gente sempre lê, ouve que devemos viver o presente; a teoria não costuma estar em sintonia com a prática. Vivendo e aprendendo.
  Deitado em minha cama, escuto rádio e observo a paisagem. Não tenho vista pro mar, nem pras montanhas, nem pra uma bela cidade. Há um basculante e duas janelas que mal posso ver, nunca se abrem e estão sempre iluminadas; duas antenas e dois ferros retorcidos; algumas plantas, muito concreto e um pedacinho do céu.
  Gosto de observar nuvens deslizando no azul do dia e no escuro da noite, mas hoje não há vento pra fazer dançar as nuvens e as plantas. Nem a chuva veio. Adoro ouvir o barulho da chuva, vê-la caindo; é como se preenchesse o seco tédio que às vezes veste minha existência.
  O frio chegou nesta semana. No primeiro dia me recusei a usar casaco, não quis aceitar que o verão tinha ido embora, como uma mão não aceita a morte de um filho.
  Meu coração está inquieto. Vejo uma sombra se aproximar, o futuro é incerto e meu espírito carece de força de vontade. Também há luz e esperança; ainda que frágeis, permaneço firme nelas.
  Talvez não saiba sobre o que falo. O importante é que pude ocupar um pouco do tempo nesta noite de tédio; você proporcionou uma pequena alegria.
  Espero ter resposta tua, notícias de tua terra distante, de teu estudo e de teu lindo coração que reflete na Bahia.
  Que a luz esteja sempre com você.

                                                    Saudades, de seu amigo
                                                    Rui Felipe

"me interessa o que não foi impresso e continua sendo escrito a mão"

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Pássaro de Cristal / Chuva Ácida

Sonhei um beija-flor de cristal
Uma luz azulada dava o tom de sonho
Voava sobre florestas encantadas
Saudando seres mágicos
Gnomos, Ondinas, Salamandras, Silfos, Elfos e Fadas
Tão veloz que o vento se sentiu lento
Tão bonito que o céu azul se sentiu cinza
Tão majestoso que um anjo veio reverência-lo
Tornava divino o ar que tocava seu rosto
Cristal nunca visto no mundo dos homens
Luz azul irradiava do coração do beija-flor
Lindo sonho azul
Além do tempo e do espaço
Sonhei um ser precioso
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Chuva que sempre lava, agora suja
Ou então, retira a capa que cobria a sujeira
O fato é que há um vazio na medida do universo
No peito um buraco negro que suga toda luz
E lança num local inalcançável do espaço
Restando a mais profunda ausência de luz
Cada gota é ácida
O corpo converte toda a dor no coração
E coloca uma tranca pra que ele não possa ser arrancado
Tortura trágica
O tempo é uma eternidade
Eis o outro lado da balança